Blog do JM

19 maio, 2006

DIÁRIO DA ÍNDIA - Parte III: Gaya, Bodhgaya e Calcutá

12/01/06 - Rumo a Bodhgaya

Acordo bem melhor do resfriado. Estou mais disposto para seguir para Gaya e, de lá, para a pequena Bodhgaya, a cidade do Mahabodhi Templo, uma estupa erguida junto à Bodh Tree, a Árvore da Iuminação,onde o príncipe Sidarta tornou-se Buda após profunda meditação. O embarque será na estacão de Mughal Sarai , do outro lado do Ganges e a 17 quilômetros de Varanasi. É uma estacão quase limpa, com lojinhas, lanchonetes, tudo mais organizado que na estação do centro de Varanasi. Decido ir ate lá no velho Ambassador, o carro que é um símbolo da India. Pago 300 rúpias, o dobro do que pagaria num riquixá. Mas acontece um imprevisto que, como veremos, so iria me beneficiar.

Na estacao, penso que por ter chegado muito cedo, me desligo. Compro uma maçã, lavo bem, como e entro em relax num banco da plataforma. De repente, uma mulher que parece missionária americana, vem apressadamente em minha direção e diz: “Você está esperando o trem para o Gaya?” Balanco a cabeça e antes que disesse qualquer coisa, a mulher desaparece. Olho para o meu relógio e decido saber do inspetor se o trem está no horario, pois faltavam 10 minutos para a partida e ele ainda não chegara. Então, o inspetor me surpreeende respondendo que o trem já passara há 1 hora! Confiro o meu bilhete. Eu me enganara.

O inspetor, um senhor gordo, pede então que eu cruze a passarela e vá até o outro lado para obter a devolução do dinheiro da passagem e adquirir outra. Ele ajudaria colocando-me em um outro trem.Faço isso mas tenho de enfrentar três filas. Não há Bureau de Estrangeiro em Mughal Sarai. Na primeira,me devolvem o dinheiro (menos 15% de multa). Na segunda é para saber se há algum trem atrasado em direção a Gaya, a fim de eu poder levar a informação a outro guichê onde, finalmente, compraria uma nova passagem. Cometo outro erro. Levo a informaçãoo, mas não especifico que desejo um bilhete de primeira classe. O cara me vende uma para o vagão geral, pago apenas a décima parte do preço e estou satisfeito, pois quero mesmo é embarcar.

Faltando 5 minutos para o trem chegar, o inspetor reaparece com um homem portando um talãozinho e me pergunta se eu quero trocar o bilhete popular por um lugar na primeira classe. Aceito. Pago mais 400 rúpias. E o inspetor me arrebata outras 100 rupias que continuei segurando, exatamente para gratificá-lo. Depois, enquanto caminhamos para o vagão, vejo que ele discretamente divide a gorjeta com o cara do talãozinho. Ele entra comigo no trem e me instala numa cama. Um indiano nervoso que está na cabine pergunta se eu aceitaria trocar de lugar com um parente seu, que esta duas cabines atrás. Aceito. Meus companheiros agora são um casal que me olha de um jeito estranho, o homem reclama para o fiscal do trem quando vê que eu não tenho passagem comprada com antecedência e estou numa cama que ele poderia ocupar, ao lado da esposa. Mas ao longo do caminho, começamos a conversar e as coisas mudaram.

Falo sobre hinduismo. A mulher, adora. Ele se abre. Canto mantras. Isso sempre abre um sorriso nos lábios dos indianos. Descubro que são devotos de Sai Baba e eles me mostram um calendário de bolso com a foto do guru. Enfim, nos tornamos amigos. O Sr. Laksham, de 65 anos, e sua mulher de 60, me convidam para ficar em sua casa, em Puri, na próxima viagem a India. Trocamos cartões, vai me escrever. Ele foi funcionário de uma empresa Americana (fabrica aco), tem filhos e netos. Falamos sobre familia, Brasil, economia, espiritualidade. Quando o trem para em Gaya, ele gentilmente me conduz até a porta do vagão. Os indianos sãoo muito simpáticos com todos mas sinto que têm uma simpatia especial por mim. Em primeiro lugar, todos dizem que pareco indiano. O fato de ser brasileiro também desperta simpatia nas pessoas. E o fato de eu saber conversar um pouco sobre hinduismo e entoar alguns mantras deixa tudo mais facil. Estou em casa.

Na viagem a Gaya,finalmente vejo uma paisagem exuberante, após ter deixado o Norte da India (Rishikesh). A monotonia de uma planície empoeirada é quebrada pelo visual do grande rio Son. Chego em Gaya as 5h da tarde e, como aqui naã ha nada para ver, opto por descansar esta noite no Siddharta Hotel, o melhor da cidade. Guarda um luxo do passado, meio decadente, mas bem organizado, calefação, restaurante requintado, mas água quente só no balde. Noite repousante. Cidade na escuridao. Mas de 5 blecautes até eu adormecer.

13/01/06 – Sob a árvore de Buda

Estou em Bodhgaya, a 13 quilômetros de Gaya, digitando estas anotações em frente ao Mahabodi Temple, que visitei nesta tarde. Vim num riquixá apertado, improvisdado como uma pequena camioneta, movida por um motor de lambreta! Mais de 10 pessoas, como numa lata de sardinha. Insisti para trazer minha bagagem comigo e não no bagageiro inseguro. Bodhgaya é um santuário budista, venerado também pelos hinduistas, que veem Buda como uma encarnacao de Vishnu. Hoje assisti a uma linda celebração junto à Bodhy Tree, a arvore sob a qual, há 2500 anos, Buda alcancou a iluminacao. Milhares de monges (muitos jovens) sentandos em posicao de lotus, no imenso jardim, entoando o famoso mantra Om Mani Padma Hum, um grande espetáculo espiirtual.

Na entrada do templo paguei 20 rupias e aceitei os serviços de um rapaz sorridente e muito prestativo, Habi, que foi meu guia na área do templo e ajudou-me nas fotografias. Os budistas são mais harmônicos, silenciosos, seus ritos não têm a barulheira do hinduismo (lindos também). Mas os hindus estão aqui e,enquanto os monges entoavam mantras,numa solenidade de reflexão sobre a impermanência de todas as coisas,(foto abaixo, à esquerda) um grupo de hindus recitavam versos do Bagavad Gita e preparavam alimentos para serem oferecidos as deidades em memória de seus pais e avós. Fotografei tudo.Mesmo trabalhando e, portanto, com um pouco de pressa saí do templo sentindo muita paz. Paguei o dobro ao Habi ( na foto à direita, ao lado da coreana de máscara, junto à Bodhi Tree),que ainda comprou uma meia nova para mim, pois ao retornar ao guardador de sapatos (Shoes House), tinha as meias brancas totalmente pretas e enlameadas.São 22h, lá fora está escuro. Escrevo na Lan House do Shiva Hotel. O melhor da cidade. Mas não consegui apartamento aqui. Nem consegui ir ao Mosteiro de monges do Butão,como pretendia, pois precisava ganhar tempo. Queria meditar com eles. Assim, aceitei ficar numa guest house pertencente ao Hotel Shiva, as uns 1000 metros daqui. Quarto simples, agua fria (quente, só no balde) e pelo visto sem roupa de cama. Pela primeira vez tive que usar o espelhinho emprestado da Fátima. Não havia um no quarto. Há mosquito. Vou ter de inaugurar nesta noite o repelente.Amanhã retornarei a Gaya, mas não sei ainda o que fazer. Preciso descer para o Sul, mas não há trem nem avião de Gaya ou Varanasi. Preciso estudar uma solução. Voltar a Delhi e, de la tomar um trem para o Sul significa três dias viajando. Vou pensar.A India continua me impactando e me surpreendendo. Que viagem. Que aprendizado. Deus me ajude. Hare Krishna.




14/01/06 – Noite fria e a dura viagem para o leste

Comecei o dia ainda em Bodhgaya, após uma noite bem dormida no pequeno quarto da Shiva Guest House. Não tinha idéia das surpresas que viriam depois. Na noite anterior sai do Ciber Café doHotel Shiva às 21h20, quando não havia mais nenhum comércio aberto, a rua estava semideserta e não havia luz na cidade - só a da Lua, um lindo espetáculo realçando a beleza do Mahabodhi Temple. Pedi então ao gerente do hotel que providenciasse alguém para me guiar até a Guest House, pois, apesar da Lua, estava escuro. Ele próprio me conduziu até lá.

Na manhã deste sábado voltei ao Mahabodh Temple e assisti ao final das celebrações dos monges e outrpos budistas da Cagiupay Sangha, com a presenca de milhares de exilados tibetanos. O café da manhã que tomei no Shiva Hotel, não me fez bem. Mas superei o problema antes de embarcar de volta a Gaya, a bordo de um simples riquixa, lotado com 8 pessoas (o motorista sobre as coxas de dois passageiros!)

Cheguei as 13h na estação de Gaya e enfrentei uma maratona de três filas e duas horas apenas para comprar uma passagem de trem para Calcutá. Esta cidade, no extremo leste da Índia, não estava no meu roteiro, mas tive que incluí-la por falta de melhor opção para descer para o Sul. Voltar a Delhi seria pior. Tive que me contentar com uma passagem no vagão Sleeper (segunda classe), pois não havia mais bilhetes na primeira. Após obter meu ticket, passei toda a tarde dentro da estação, alimentando-me apenas de pepsi-cola e maçã. Só sai uma vez, logo retornando, pois a poeira em qualquer rua das pequenas cidades da Índia e algo infernal. Poeira e buzina. Meu trem deveria sair as 21h30. Só chegou a Gaya às 4h da madrugada seguinte.

Para mim foi uma longa noite de frio, pois as áreas semi-fechadas da estação foram logo ocupadas por passageiros, pedintes etc, que chegam em grupos e armam suas “camas” no chão, espalhando lençóis e travesseiros trazidos em um bolsa suplementar. Os atrasos são comuns e as pessoas chegam as estações equipadas para enfrenta-los.Para sorte minha, às 20h, quando voltei a Inspetoria da estação para saber se o trem estava no horário, encontrei o Gilles, um canandense de 47 anos (foto à esquerda) ,que está pela terceira vez na Índia pela terceira vez. Uma pessoa gentil, sorridente e tranquila que muito me ajudaria. Ele é professor de Yoga em Montreal, no Canadá, estava vindo de Bodhgaya com destino a Calcutá. Dessa vez sua intenção é ficar 6 meses na India. Giles costuma trabalhar 4 meses em sua cidade (complementa a renda fabricando e vendendo artesanato), junta dinheiro e depois sai pelo mundo. Seu plano atual: passar 1 e meio circulando pela India, Paquistao, Bangladesh, Irã, Tailândia, Vietnã e Europa.

O Giles me passou muitas dicas sobre os indianos, Calcutá e sobre o sul da Índia. Ele também vai visitar o ashram de Sai Baba, mas nao agora. Viaja o tempo todo de trem e, quase sempre, na segunda ou na terceira classes para economizar. Enquanto esperávamos o trem, conversamos também com um indiano que mora nos Estados Unidos. Mais dicas.Quando finalmente o trem chegou, foi grande o impacto de usar a segunda classe. Cabines mais apertadas que as da primeira classe, com seis camas em três niveis, mais tres camas laterais no corredor e total ausência de ar condicionado. Frio, muito frio na madrugada. Uma confusão, um aperto, muita gritariaI. Fiquei acomodado na terceira berth lateral, a mais alta. Tive que usar toda a saúde para, no meio do empurra-empura, colocar as mochilas lá em cima e saltar para cama suspensa, de apenas meio metro de largura e 1,5 metro de comprimento.


Ao acomodar-me, senti-me no paraíso. Lá embaixo a confusão aumentou ainda mais, pois muitos passageiros, inclusive eu e o Gilles, tomamos o vagão errado. Troca-troca enquanto o trem corre. Ainda bem que o fiscal autorizou-me a continuar na mesma berth, pois estava livre.

15/01/06 - Oh! Calcutá!

A viagem foi longa e cansativa: 12 horas até Calcutá, com o trem parando a cada meia hora. Só cochilei, encolhido. Depois, sentado, pois a bagagem não me permitia estirar as pernas. Dessa vez, só água e biscoito que comprara antes. Tenho tomado chá com chocolate oferecido nas paradas por vendededores que entram no trem. Mas na noite anterior, em Gaya, tive oportunidade de ver um vendedor preparando a bebida e achei melhor não mais arriscar. Calcultá é uma grande cidade, mas num final de tarde de domingo não era possível comprar passagem de trem para para Hyderabad, conforme roteiro que eu e o Giles planejamos no trem. E eu estava tão cansado que já decidira ficar duas noites na cidade. Como veremos no dia seguinte, mais uma vez as circunstâncias ocorrem para me beneficiar, gracas a Deus. Fizemos algumas fotos na estação. Tomamos um táxi e fomos para a área da Sudder Street, perto do Museu da India, onde há hotéis baratos e médios. É um ponto de concentração de estrangeiros, numa boa área da cidade.

Com a mochila nas costas, saimos, eu e o Giles, cotando precos. Eu queria ficar e fiquei no Capital Guest House, o primeiro que encontrei e que é recomendado pelo The Rough Guide to India. O Giles achou caro (12 reais o apartamento de solteiro) e foi para o Paragon. So nos reencontramos no dia seguinte. No Hotel tomei o melhor banho gelado de minha vida. O cansaço era enorme, a sujeira mais ainda. Aproveitei para pedir lavagem de roupa. Prometeram-me entregar amanhã à noite.

Depois disso, sai para jantar. Minutos após deixar o hotel, sou abordado por um senhor que me oferece maconha e haxixe. Dispenso-o . Seria o único a me abordar nestes termos, apesar da área atarir traficantes que vêm oferecer seus “produtos “ para jovens turistas.Jantei num restaurante na mesma rua, bem acolhedor e, ao que tudo indica de propriedade de um brâmane. Enquanto jantava, com outro estrangeiros, o garçom acendeu incensos, fez rituais para imagens de deidades penduradas na parede e, diante do oratório de Kali, usou incenso em pó e encheu a pequena sala de fumaçaa perfumada. Depois, um brâmane apareceu com uma lamparina (acesa durante os rituais nos templos) e que ao cair da tarde é levada para lugares públicos, a fim de “abençoar” devotos. Pessoas põem, a mão na chama, o brâmane faz orações e unções na testa da pessoa, entrega alguns grãos e o fiel deixa algumas rupias na bandeja. Na rua, pessoas fazem rituais num oratorio ao lado do restaurante. Comi bem e, cansado, vou dormir como um anjo.


16/01/06 – Contrastes e ciladas da metrópole

Acordei às 8h e com a intençãoo de ir direto para Bangalore, no Sul, de avião. Ir de trem seria um sufoco e iria complicar o meu roteiro. Até aqui cumpri tudo o que planejei, mas talvez tenha de cortar minha ida a Pondicherry, onde está o ashram de Aurobindo. Na saída fui abordado pelo dono do hotel. Queria saber meus planos de embarque e disse que eu poderia comprar a passagem aérea na própria agência do pequeno hotel (pertence ao filho dele, Umest). Poderia fazê-lo dentro de meia hora. Aproveitei para ir tomar café no mesmo restaurante da véspera e cotar o preco de passagens em agências vizinhas. Acabei fechando negocio com a agência do hotel, na verdade eles trabalham para uma agência maior na mesma rua. Insisti e paguei com cartão Visa (ninguém recebe o meu Diners aqui). Passagem cara, comparada ao trem (o melhor transporte tradicional na India, apesar de tudo): 130 dolares, ou 270 reais, pela Deccan Airlines, uma companhia de vôos baratos. Mas vale a pena, pois vou ganhar dois dias e poupar um pouco minhas energias.

Embarcarei amanhã as 12h40. No pacote da agência, já está incluido o carro para o aeroporto.Resolvido isto, fui ao hotel do Giles (ele havia me procurado no Capital Guest House, enquanto eu estava fora). Lá estava um bilhete seu para mim. Encontrei-o em seguida numa Lan House e resolvemos fazer o nosso próprio roteiro por Calcutá. O hotel me oferecera carro e motorista particular por 15 dólares. Fomos de metrô (que existe aqui é limpo, mas não pode ser fotografado) ao templo de Kali ( a deusa que vela pela cidade. Calcuta quer dizer Templo de Kali), onde uma multidão formava fila para entrar num lugar supreendente. Trata-se do mais antigo templo de Kali do país Se não estou enganado, o lugar surpreendeu Gandhi, que ficou chocado e entristecido ao ver o volume de sangue de animais sacrificados à porta. Os sacrifícios de cabras continuam, mas a maioria das pessoas leva oferendas de guirlandas e comidas, inclusive côcos, cuja água e deramada à porta do templo.


Encontramos um cara que nos apresentou a um brâmane (talvez ,falso brâmane) que,rapidinho nos levou ao interior do templo, furando a fila. Fez orações, nos deu incensos e rosas para oferendas. Deixamos os sapatos numa lojinha. Na volta tive que jogar as meias enlameadas na rua. No final, o tal brâmane queria uma doação de pelo menos 2000 rupias para o templo. Dei 500 (uns 25 reais), a contragosto. E fiz algumas fotos numa área onde fiéis se banham num tanque de águas dos rios sagrados (suja !). Dentro dos templos hinduístas nunca se pode fotografar. Depois disso fui visitar a instituicao das Missionárias da Caridade, de Madre Teresa de Calcutá (foto à esquerda), ao lado do templo de Kali. Estava fechada, em horário de almoço. Fotografei por fora, incluindo a multidão de pobres que continua a ser amparada pela instituição.

Voltamos ao metrô e fomos para o Memorial Victoria (foto à direita) , um lindo palácio imperial, do tempo dos ingleses, fechado nesta segunda-feira. Mesmo assim, havia uma fila enorme de pessoas comprando ingressos apenas para passear nos jardins. Preferi dar uma volta de carruagem no parque em frente. As fotos contra o sol não ficaram boas. Já no final do tarde, fomos a um bom restaurante, na área do Parque Elliot, comemos comida israelense (ou seria grega?) - chamada pita. Fui rapidamente a uma das boas livrarias e a uma casa de Cds e DVds e voltei para a área do meu hotel.Calcuta e uma cidade enorme. Tem aparência ocidental na área central, mas o toque indiano está na pobreza da periferia, nas pessoas andando até mesmo nuas nas ruas, no trânsito caótico, feito por luxuosos automoveis Ambassador (a frota amarela de taxis e imensa), ônibus e bondes caindo de velhos. No centro, nenhum autoriquixas. Em compensação, há riquixas com tração humana. Isto mesmo: carruagens puxadas por homens muito pobres, uma caracterista única da cidade.

Enquanto escrevia estas anotações, ouvi vozes de dois rapazes, falando em português. Eram jogadores de futebol, cariocas, ex-Figueirense de Santa Catarina, que estão jogando em Goa (no time Salgoa Cars). Fiz entrevista com o Bruno, um deles. Estão em Calcutá para uma partida. O esporte nacional aqui e o Criquet. Mas o futebol é paixão também em Calcuta e Goa. O Bruno, de 23 anos, está chocado com a vida aqui. Fala diariamente com o Brasil, às vezes durante 5 horas. Seu amigo estava à procura de alguma droga. Daqui a pouco a Lan House vai fechar. Sâo 21h15. O canadense Gilles ,que foi ao seu hotel, já retornou. Vamos jantar. Amanhã certamente terei novas surpresas.

[No próximo relato, Bangalore, Puttaparthi (ashram de Sai Baba) e Goa. Para ler os registros sobre Delhi, Rishikesh, Agra, Fatehpur Sikri e Varanasi consulte as Notas do Arquivo]
[Estas anotações informais complementam a reportagem do site www.planetajota.jor.br ]

03 maio, 2006

Diário da Índia – Parte II: Agra, Fatehpur Sikri e a cidade sagrada de Varanasi

07/01/06 – No tumulto de Agra
O riquixá chega no horário e estaciona à porta do ashram Okaranamda Saddam, em Rishikesh. O garoto da recepção, interrompe o seu sono, sobre o mármore frio, para avisar-me. Acordei as 4h30 da manhã e viajo sem banho, pois não tive coragem de enfrentar a água gelada numa noite de temperatura em torno de zero grau. Despeço-me, emocionado, da linda paisagem do Ganges ainda refletindo na escuridão as luzes do altar de Rama, Sita e Hanumam e o ghat majestoso do ashram Parmath na outra margem. Chego a estação ferroviária de Haridwar bem antes do horário da partida do trem que me levará a Agra. Espero, espero. Frio demais, talvez abaixo de zero, não há termômetro na estação. Comprei bilhete da primeira classe, mesmo assim o trem é antigo, com cabines dotadas de cama. Fico com outras três pessoas. Uma delas a médica Hinco, da cidade de Dehra Dun, no Utaranchal, que segue para Agra com a filha Burbul, de 3 anos.
Hinco , especializada em terapia intensiva, é da nova geração de mulheres indianas. Usa calça comprida em vez do sari, toma (muita) Pepsicola e viaja lendo a revista Femina, que lembra uma revista feminina ocidental. Nas matérias, muita moda do ocidente, uma reportagem sobre as mulheres brasileiras e seus corpos avantajados, mas também receitas de comida.
Converso com Hinco, deitado. Estou cansado. Ela ri quando digo que meu inglês é mais precário que o de sua filhinha. Depois a conversa se amplia com a participaçãoo de um rapaz, timido, que é sargento do Exercito indiano. Umm dia de jejum. No trem para Agra, ao contrário do que me levou de Delhi para Rishikeshi, nada serviram e eu fiquei com receio de comer as panquecas oferecidas por vendedores que entram no trem nas inúmeras paradas. Só tomo chá e leite com chocolate.O trem é muito lento e atrasa quase 4 horas num percurso de pouco mais de 400 quilômetros.
Na descida em Agra, um horror. Sou cercado por vendedores e cambistas que a todo custo querem me levar para algum hotel. No tumulto, encontro duas estudantes sul-coreanas, Kim e Won (acho que com menos de 20 anos de idade), que aparecem na foto acima. Elas estão apavaradas com o cerco e se juntam a mim. Falam menos inglês que eu. Vamos ao guichê de informacões, telefonamos para o hotel Sheela, que fica a 200 metros do Taj Mahal e a 15 quilômetros da estação ferroviária. Ninguém atende. Os cambistas dizem que está lotado. Decidimos correr o risco e ir ate lá. Alugamos um auto-riquixá prepago por 62 rúpias e nos lançamos a aventura pelas ruas escuras. No riquixá cabem dois. Sentamos os três com as respectivas mochilas e acessórios no colo. Só nossas cabeças de fora. Um frio de cortar. A pequena carruagem é aberta.
Somos bem recebidos no hotel mas, como não temos reserva, o recepcionista diz que vai conseguir dois apartamentos nos fundos por apenas uma noite. No dia seguinte teremos de mudar de hotel, de preferência para o Sheela Inn, da mesma empresa. Almoço então às 8h da noite, dividindo a mesa com uma jovem alemã que viaja sozinha pela Índia. Ela me passa algumas informações. Telefono para minha casa e para a dos meus pais. Estou exausto. E no banheiro, apesar da promesa de água quente, o banho em balde era frio!
08/01/06 – O esplendor do Taj Mahal
É sábado e acordo com um princípio de resfriado (coisa rara de acontecer comigo). Enfrentei muito frio na madrugada. Aqui no interior da Índia é difícil encontrar chocolate em barra. Estava sem nenhum recurso, tremi demais na madruga, não dormi satisfatoriamente. Faço fotos com as coreanas. Após tomar um café da cafe da manhã reforçado, na companhia da jovem alemã, mudo de hotel. Vou para o Sheela Inn, hotelzinho novo, porém, mais distante do Taj Mahal. Depois, driblando o cerco agressivo de vendedores, vou direto a entrada mais próxima do Taj. O palácio - na verdade o túmulo de uma rainha, construído pelo imperador Shah Jahan, no século XVII. É uma homenagem do imperador muçulmano a sua esposa mais querida, Mumtaz Mahal, que morreu durante o parto de seu 14º filho, em 1631. Mereceu o título de uma das 7 maravilhas do mundo, que ostentou por muito tempo.
Há um conjunto de edifícios na área do Taj Mahal, todos muito lindos e expressando a arte persa. No sol quente, agasalhado, o calor é intenso. Não consigo regular a câmera fotográfica Canon profissional. O sol intenso sobre o Taj Mahal estoura tudo. Minha maquininha Fuji Fine Pix entra em açãoo. Reencontro lá as meninas coreanas, que decidiram ir para outro hotel, mais barato. Elas são muito simpaticas. Estou sem energia, cansado. A visita aqui pode durar até um dia.
No meio da tarde vou ao Agra Fort (foto à direita), outro monumento junto ao rio Yamuna, onde o imperador que construiu o Taj foi aprisionado depois. Não entro. Teria que pagar mais 250 rúpias, eu ja pagara 750 no Taj e estava muito cansado. Faco fotos no átrio da recepcao e por fora. Ao tentar voltar ao Taj Mahal, reencontro as coreanas, mas agora eu estou no meio de uma discussão com um motorista de riquixá. Pedira para ele me levar de volta ao Taj (eu combinara com o oficial de segurança que voltaria para complementar minhas fotos no pôr-do-sol, com a máquina Canon) e quando o rapaz tomou outro rumo eu saltei da carruagem e desisti.
Acabei indo em outro riquixá, mesmo assim o motorista parou várias vezes no caminho para tentar me convencer a ir a lojas. Depois me disse que ganha comissão, que precisa disso para viver melhor, me pediu ate o casaco de frio. Expliquei a minha situação e exigi que me levasse até a entrada do Taj Mahal.Nesta tarde foi dificil lidar com os cambistas. Eles estavam demais. Agra tem monumentos incríveis, mas é um lugar onde o turista é infernizado o tempo todo.
Amanhã irei a Fatehpur Sikri , a cidade que foi construida para ser a sede do império mugal na India, situada a 46 quilômetros daqui. Depois quero repousar, pois às 7h da noite embarcarei para Varanasi, outra cidade sagrada do hindus, e a viagem de trem devera durar no mínimo 15 horas. Quero sair de Agra. Este lugar, preferido pelos turistas, não faz o meu gênero. Vou para o Hotel Sheela Inn, para onde mudei hoje, e quero um big jantar.

09/01/06 - Fatehpur, a cidade-fantasma
Na Índia é preciso confiar. Na noite anterior, ao sair de uma Lan House junto ao Taj Mahal, onde digitei meus emails, era mais de 21h e já não havia mais lojas abertas nem riquixás para me levar até o hotel Sheela Inn. Frio, nevoa e escuridão na avenida. Fui até a rua ao lado e encontrei uma outra Lan House, que é também agência de turismo, aberta e sem nenhum cliente. Em frente, alguns funcionários jogavam voleibol. Perguntei se não havia mais riquixás. Vijay, um rapaz que é o dono do negócio, disse que não, mas se ofereceu para levar-me até o hotel. “Fique aqui. Vou pegar o meu carro”, disse. Tive receio, mas não havia alternativa melhor. Entrei no carro e ele foi fazendo perguntas sobre o meu roteiro no dia seguinte. Acabei fechando negócio com ele para me levar a cidade imperial de Fathepur Sikri. Fiz isso mais por gratidão pelo favor que ele estava me prestando.Valeu a pena.
Hoje fui às ruinas de Fatehpur Sikri, no conforto de um automóvel. Se fosse de riquixá certamente teria piorado do resfriado, pois em todo lugar há poeira demais. Em Fatehpur acabei contratando um guia local, que me falou sobre a mesquita, o túmulo sheik Salim Chishti, sobre o palacio real, etc. O rapaz ainda me ajudou a fazer fotos. A Fatehpur histórica é uma cidade-fantasma. Foi habitada durante apenas 20 anos. Uma seca longa, que acabou com a água na região, tornou-a inóspita demais. Mas hoje é um local importante para os muçulmanos da Índia. Sua linda mesquita, mesmo desativada, atrai fiéis, inclusive sufis.
Ao longo do caminho de Agra a Fatehpur encontrei inúmeros lingam (insígnia ou pênis) de Shiva na entrada dos campos, nas vilas. Esse é um dos principais ícones de adoração na Índia. Na volta, acertei com o Vijay para levar-me a noite a estação ferroviária de Idghar-Agra (fora da cidade), onde tomaria o trem para Varanasi. A tarde fotografei meninos jogando cricket (o esporte nacional aqui), almocei na cobertura do hotel e, de lá, fotografei a cidade, o Taj Mahal e o vizinho megahotel Oberoi, enorme e luxuoso (200 dólares a diária, caríssimo para o padrão indiano), erguido no meio de casas humildes, numa rua sem pavimento.
Cheguei cedo a Idghar e esperei o trem por três horas no maior frio. Idghar é uma pequena estação, um galpão aberto, com alguns bancos sujos, paredes escarradas, como muitas estações na Índia. Nesse período de espera houve dois blecautes (falta luz dezenas de vezes durante o dia nas cidades indianas, todo hotel ou loja tem seu gerador). Escuridao quase total na estação. Aparece um mochileiro russo que inicia conversa comigo. Um rapaz de 25 anos, funcionário do servico de meteorologia de uma cidade próxima a Moscou. Chega com sua garrafinha de uisque na mão. Falamos sobre Rússia e Brasil, ele insiste para que eu tome sua bebida para superar o frio, mas não aceito. Aliviei a tremendeira com um chocolate que havia guardado na mochilinha. Depois chega um casal de jovens russos e o rapaz começa a se comunicar em sua língua nativa. Nos separamos quando o trem chegou.

A viagem para Varanasi foi solitária. Dessa vez me colocaram numa berth (cama de trem) lateral. Durante todo o tempo só bebi água mineral e comi biscoitos. O trem atrasou 5 horas. Em vez de 9 da manhã, chegou a Varanasi às 14h.
10/01/06 – Na cidade sagrada de Shiva
Na chegada a Varanasi, o cerco dos touts (vendedores) foi agressivo. Fui direto à sala de atendimento a estrangeiros, onde enfrentei uma fila para trocar a data de minha viagem para Gaya. Gripado, queria ficar um pouco mais para descansar num bom hotel. Marquei para o dia 12. Enquanto estava na sala, dois vendedores que me seguiram desde o momento emque piseina plataforma da estação, abriram a porta para ver se eu ainda estava lá. A impressão que a gente tem é se trata de um assalto iminente, mas é só gente pobre querendo ganhar uma pequena comissão. Vou então ao Centro de Informacões Turísticas, peço informações sobre preço de riquixa até o Hotel Surya ( foto à direita) e volto à batalha com os vendedores. Insisto que quero um riquixa pré-pago. O vendedor que me abordou na porta do trem me leva até um e vai comigo até o hotel. Um rapaz tímido, bem humilde, mas insistente. Dou uma gorjeta no final.
Na saida da estação central, uma cena impressionante. Milhares de pessoas sentadas no pátio da estação. Muitos peregrinos que vem a Varansai para cumprir obrigações religiosas. Varanasi é uma das cidades sagradas do hinduísmo. Teria sido fundada por Shiva, um dos integrantes da trindade divina do hinduismo. Vem peregrino de toda parte, muitos apenas para morrer aqui, pois acreditam que morrer em Varanasi os livra da roda das encarnações. Varanasi (3 milhões de habitantes!) é empoeirada, confusa, uma loucura para os olhos ocidentais, mas a religiosidade está em cada esquina nos milhares de santuários de rua, que os hindus chamam de templo independentemente do tamanho.
O Surya é um hotel elegante e confortável (umas 3-4 estrelas no Brasil), tem um jardim central muito bonito, apartamentos com um certo luxo e com água quente a toda hora (uma raridade na Índia), além de um restaurante requintado instalado num antigo palacete que pertenceu ao rei do Nepal. Como me sentia fraco, resolvi burlar minha dieta vegetariana (na India, a comida vegetariana é básica, mas é fraca, sem soja). Comi um prato com pedacos de frango. Não tinha hot spice (molho picante). Pois bem, na madrugada tive diarréia. Acho que o molho picante protege contra bactérias.
Tudo aqui, no hotel, é um pouco mais caro do que lá fora. Internet, lanches. Mesmo assim, a parada no Surya tem sido boa e repousante. Queria assistir a um Kirtan noturno (das 20h a meia noite) no templo de Hanumam, mas o recepcionista do hotel desaconselhou-me, pois já eram 23h e a cidade está escura com o blecaute.
11/01/06 - Os rituais nos ghats de Varanasi
Acordo cedo, às 5h. Comprara um bilhete para um passeio guiado à Old Varanasi (Varanasi antiga), incluindo um trajeto de barco no rio Ganges (ao longo dos ghats, as escadarias onde os devotos se concentram) e uma visita à Universidade Hindu e templo de Durga. Encontro, ainda na escuridão da madrugada, um casal da Nova Zelândia que eu vira rapidamente no trem (Dougal e Sonya McGowen), juntamente com um casal de holandeses (Tomas Simons e Martha), todos jovens mochileiros (na foto à esquerda estamos no café Bread of Life, os neozelandeses ao meu lado). Eles se aquecem em torno de uma pirâmide de fogo junto com funcionários do hotel. Aqui o fogo está presente em tudo, nas cerimônias dos templos e nas portas de casas.

Saímos, os cinco, numa pequena Van em direção à Old Varanasi, o motorista falando um inglês pausado e claro, explicando a origem da cidade, seus diferentes nomes (Kashi para os hindus, Benares para os muculmanos que dominaram a regiao_ e Varanasi, nome que é a reuniao de Varuna e Asi, duas rios). Fala sobre Shiva, sobre a purificaçãoo nas águas sagradas do Ganges (Ganga, em sânscrito, nomeia o rio, que é também deusa), sobre as cremações de cadáveres para que o fogo purifique as almas e as impulsione ao nirvana. Descemos da Van e adentramos a Varanasi antiga caminhando por vielas mais estreitas que as da medina de Fès, no Marrocos, sujas, enlameadas. Chegamos a um ghat, descemos a escadaria e passamos a um barco, onde o barqueiro passa a ser o nosso novo guia.

Percorremos o Ganges na alvorada, ao longo dos muitos ghats, o barqueiro explicando explicando sobre cada um deles (o mais importante e o Dashaswamedh), sobre os templos e os palácios edificados por antigos marajás, hoje sujos e abandonados. Há uma pequena multidão de pobres, muito pobres, devotos já se banhando nas águas poluídas desse trecho do Ganges. Ali se escova os dentes, se bebe a água. Fotografo tudo. Os meus amigos de passeio me ajudam. Mas tenho de guardar a máquina quando chego ao primeiro ghat de cremacao. Ja há corpo sendo queimado. E proibido fotografar nos templos e nesses ghats. Fotografo o lindo nascer do sol no Ganges, um momento especial para turistas e para fiéis.
Voltamos à van e vamos em direção à Universidade Hindu e ao templo de Durga (dentro da Universidade), agora na companhia de outro guia, um cara inteligente e versado em hindusimo. É o primeiro guia que desce a detalhes da filosofia veda, aprendo sobre o significado do mantra Om, sobre o tridente de Shiva (que aparece em todos os templos), sobre a unidade na diversidade. No final, só eu dou uma gorjeta para o guia. Os neozelandezes e holandeses, não. Acho que ele deu uma pequena aula de hinduismo, mas só eu estava interessado no assunto.Tomas e Dougal dizem que não querem voltar para o hotel. Vão conhecer a cidade velha, caminhando. Fico com eles. A van nos deixa no “Bread Of Life”, um café requintado em meio à sujeira da cidade antiga, onde tomamos café da manha. Durante o café descubro que a mulher do Tomas é colombiana, radicada há muitos anos na Holanda, e converso um pouco com ela em portunhol.

Depois, seguindo apenas os mapas de nossos guias (Lonely Planet e o meu The Tough Guide to India), nos aventuramos por um passeio, inicialmente pelos ghats. Visitamos os principais, conversarmos com as pessoas, fiz mais fotos e assistimos a duas cerimônias de cremacao. É chocante. O corpo é colocado na grande fogueira e na medida que vai virando cinzas, é virado como um churrasco. Os familiares, só os homens, são mantidos à distância. As mulheres ficam em casa para não perturbarem a cerimônia com o choro. Há muitas vacas no local. A cremação é um procedimento de purifificação. Só homens comuns são cremados junto ao Ganges. Os sadhus (homens santos,que vivem mendigando ou habitam cavernas) não são cremados. São simplesmente atirados ao Ganges. Eles não precisam ser cremados. Os sadhus já vivem com Shiva, diz um indiano para mim. Sempre encontramos essas pessoas simpáticas que nos explicam tudo sobre a cremação e , no final, pedem algumas rúpias para comprar madeira para as fogueiras. Vemos um cadáver boiando no rio. Penso que é gente, mas é uma vaca. Pertinho, devotos tomam banho.
Na cidade velha, creio, escalamos, em cerca de duas horas, mais de 1 000 degraus. A Faáima não resistiria. Também nos ghats encontro e fotografo os famosos limpadores de orelhas, que me oferecem os seus serviços. Há iogues e falsos iogues chamando para sessões de meditação e yoga e terapeutas ayuvérdicos querendo a todo custo fazer uma massagem no turista ali mesmo (alguns aceitam). Para tomar refrigerante no alto de um palácio antigo, mais cinco andares a pé. Depois nos perdermos nas vielas, à procura do Templo Dourado, que fica junto a uma mesquita, no centro da cidade antiga, por sua vez guarnecida por dezenas de policiais. É que a mesquita foi construida no lugar de um antigo templo hindu, durante o domínio muculmano, e há sempre a ameaça de hindus fanáticos de destrui-la. Revezamos a entrada no templo. E preciso deixar fora a nossas mochilas, câmeras e celulares. Estrangeiros só podem ter acesso ao pátiodo templo. O interior, só hinduístas indianos.
Percorrendo as vielas da Old Varanasi vemos como na Índia os tempos se interligam e convivem. Naqueles becos tumultuados há um retrato vivo da vida há centenas de séculos, um comercio esfuziante e a presenca da Internet e dos telefones high-tech que aqui encontramos em toda esquina. Na ruela estreita passam pessoas, vacas, motos, lambretas, quase que por milagre. E numa das portinhas vi a entrada para um curral de vacas leiteiras, bastante gordas. Isso mesmo. Um curral no meio daquela confusão, com as vacas entrando e saindo por um portinha estreita e humilde.Cansados, decidimos voltar ao hotel às 13h. Tomamos um riquixá por 60 rúpias. Acertamos que eu e os holandeses iriamos em um riquixá e os neozelandeses em outro. No final. Fomos os cinco no mesmo riquixá, com os neozelandseses pendurados ao lado do motorista. Ainda assim, não batemos o recorde. No caminho, encontramos outro riquixá com umas oito pessoas dentro (num espaco onde só cabem 3 e o motorista).
Desisto de ir a Sarnath, onde Buda fez seu primeiro discurso (sobre a Roda do Samsara). Teria mais rodar mais 17 quilômetros, o que na India é bastante cansativo. Dedico a tarde e a noite a descansar, me alimentar e preparar-me para a viagem a Gaya, no dia seguinte.

[No próximo relato, Gaya, Bodhgya e a árvore da iluminação de Buda, e Calcutá. Para ler o registro sobre Delhi e Rishikesh, consulte as Notas do Arquivo de Abril]
[Estas anotações informais complementam a reportagem do site
www.planetajota.jor.br e a edição especial ÍNDIA - A deusa de mil faces, da revista Viagem e Turismo, da Editora Abril]